Desde que o Instituto Rosa e Sertão, organizado por mulheres, recebeu o projeto Dona do Meu Fluxo (DMF), em 2017, no Parque Nacional do Grande Sertão Veredas, a professora de música Daiana Campos, de Chapada Gaúcha (MG), e cerca de 450 colegas de povoados como Sagarana não usam mais absorventes. Aderiram ao coletor menstrual.
“Foi uma descoberta revolucionária. A princípio, era estranho, um objeto no canal vaginal, mas depois consegui sentir melhor como se usa. Hoje, é superprático e consigo fazer minhas atividades diárias, caminhadas e andar de bicicleta”, conta ela. Sua namorada, a também musicista Rafaela Carneiro, resolveu adotar o método “Comprou agora. Está esperando a bendita descer para usar pela primeira vez”, revela Daia: “É bom porque não impede de namorar”.
Uma das responsáveis por introduzir o coletor menstrual no cerrado, a turismóloga mineira Mariana Madureira vai além: “Seria incrível se não só fosse garantido o acesso a produtos de higiene menstrual, mas esses itens fossem ainda ecológicos e saudáveis!”
Há seis anos, Madureira lançava o DMF, parceria da sua empresa, a Raízes Desenvolvimento Sustentável, voltada à geração de renda e autonomia feminina em comunidades pobres, com uma fabricante de produtos criados para “aqueles dias”, a Korui, de Florianópolis (SC). Desde que surgiu, a iniciativa já distribuiu mais de cinco mil coletores em várias regiões do Brasil.
Na ação de estreia, realizada em regiões como o Vale do Jequitinhonha, a mais pobre do Brasil, foram distribuídas centenas de unidades entre os mineiros — uma parte dessas destinadas às integrantes do Rosa e Sertão. As doações foram feitas junto a workshops para ensinar às mulheres como utilizar o acessório.
“Aqueles dias”
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O coletor menstrual é uma espécie de copinho de silicone, similar a um funil, em três tamanhos (25, 29 e 34 ml) e com até dez anos de validade. Diferente dos absorventes convencionais, não contêm alergênicos. São vendidos a R$ 79 a unidade, substituindo o uso de dois mil modess durante a vida fértil de uma mulher. A economia é de R$ 6.000, sem falar na questão ecológica: evita-se o descarte de 150 quilos de resíduos nesse período.
“A Korui já impediu o descarte de 150 milhões de absorventes, ou 2,3 mil toneladas de lixo. Se colocados lado a lado, esses absorventes dariam uma volta completa no planeta”, afirma a fundadora da empresa, Luisa Cardoso. A Korui tem produção 100% nacional e aferiu um salto de 372% nos lucros entre 2018 e 2020. A empresa ainda doa coletores menstruais em parceria com a Raízes, como forma de mitigar a pobreza menstrual no Brasil.
A nível global, os coletores menstruais devem gerar US$ 963 milhões por ano em 2026, de acordo com uma previsão da consultoria Technavio. O produto surgiu nos anos 1930, mas passou décadas desconhecido por causa de uma série de tabus menstruais. Popularizou-se apenas no século 21, segundo as conhecedoras do assunto.
“No Pará, as ribeirinhas menstruadas não se banham no rio porque atrai o boto. E também tem aquela coisa de cachorro ir atrás — isso é um fato”, observa Madureira. “O coletor não deixa cheiro, então nem os cachorros nem os botos te seguem”, acrescenta.
Em 2020, a iniciativa distribuiu mil coletores no Parque Indígena do Xingu (MT). “Lá inclusive tem a barreira da língua, então entregamos para multiplicadores que levaram às aldeias.” Em julho de 2020, uma ação voluntária do DMF atendeu favelas de grandes cidades (em São Paulo, Rio, Salvador, Recife e Florianópolis).
O movimento tem, por princípio, desenvolver a consciência feminina sobre os próprios ciclos, segundo as integrantes. “O primeiro passo para você ser dona do fluxo da sua vida é ser dona da sua menstruação”, defende a líder do projeto. Entre as prioridades, está combater a ideia de que a menstruação é algo sujo, motivo de vergonha nos debates.
Adaptação
Nem todas as mulheres, contudo, se adaptam ao prático utensílio. Em Chapada Gaúcha, por exemplo, uma das contempladas pelo projeto, Adriana Pereira, não se acostumou a utilizá-lo. “Pois é. Não sei se é porque meu fluxo menstrual é muito intenso. Aquilo me dava muita cólica, incomodava”, conta.
Adriana trabalha numa farmácia, onde distribuem camisinhas de graça. Uma colega sua não entende porque os absorventes estão fora, no limite, da cesta básica. “Pra mim, não é caro. Mas tem muita gente sem condição, principalmente na roça”, observa. É costume entre mulheres, segundo ela, para evitar o gasto, usar folha de bananeira e miolo de pão quando estão “de chico”.
Daia, por sua vez, tem até uma superstição em relação ao coletor, do qual nunca arredou o pé. “Plantar lua”, ela explica, “é tirar o copinho da vagina, ver o sangue, sua espessura, sentir o cheiro, misturar com água e regar as plantas”. Coisa que o absorvente não permite, segundo a representante. “Isso, por si só, já é empoderamento feminino”, afirma.
O Coletor Menstrual
O coletor menstrual é uma opção durável, pouco alergênica e que não favorece a proliferação de bactérias. Sendo assim, é uma escolha vantajosa para aqueles que desejam economizar, reduzir o desperdício e evitar alergias aos absorventes convencionais.
Existem várias marcas confiáveis de coletores menstruais disponíveis em sites brasileiros. É importante fazer uma pesquisa antes de comprar, pois alguns coletores mais baratos vendidos por desconhecidos podem ser fabricados na China e não serem feitos de silicone medicinal, o que pode ser prejudicial à saúde.
As marcas costumam oferecer diferentes tamanhos de coletores, o que facilita a escolha do ideal para cada pessoa. Em geral, o tamanho varia conforme a idade e se a pessoa já teve filhos.
O coletor menstrual tem uma vida útil longa, podendo durar anos se for bem cuidado. Alguns coletores podem durar até dez anos, desde que não sejam danificados pelo uso, caiam no vaso sanitário ou sofram danos ao serem higienizados.
Custo Benefício
Apesar do custo inicial do coletor parecer alto, ao fazer um cálculo a longo prazo, ele se torna mais econômico do que comprar absorventes mensalmente ao longo dos anos. Portanto, vale a pena fazer as contas e comparar os gastos.
Você não precisa necessariamente ter mais de um coletor, a menos que queira. Porém, algumas pessoas podem se sentir mais seguras alternando o uso durante o ciclo menstrual, o que é perfeitamente aceitável.
Ao colocar o coletor menstrual, é necessário dobrá-lo e posicioná-lo corretamente no canal vaginal. O material flexível e a anatomia vaginal permitem que o coletor se abra e se ajuste adequadamente, ficando bem posicionado.
Como Utilizar o Coletor Menstrual
Existem diferentes dobras que podem ser utilizadas para encaixar o coletor. Se uma não funcionar bem, é recomendado tentar outras com calma até encontrar a que melhor se adapta.
Uma vez bem colocado, o coletor menstrual não deve ser sentido dentro da vagina, desde que esteja posicionado corretamente. Na região vaginal, os dois terços superiores não possuem a mesma sensibilidade que a pele.
Se encontrar dificuldades para inserir o coletor, é possível passá-lo sob água para facilitar o processo, mas jamais utilize lubrificantes ou óleos, pois podem danificar o material e causar alergias.
Ao inserir o coletor, é importante direcioná-lo horizontalmente em direção ao ânus, evitando posicioná-lo muito alto, o que pode causar desconforto ou pressão na bexiga. Encontrar a melhor posição para a inserção pode depender da preferência pessoal e do corpo de cada indivíduo.
Alguns coletores podem ter cabinhos que incomodam. Caso isso aconteça, não há problema em cortá-los ou usar o coletor do avesso para maior conforto.
Uma vez posicionado corretamente, o coletor fica firmemente no lugar graças ao assoalho pélvico, uma musculatura que mantém o coletor fixado no canal vaginal. Os pequenos furos no coletor promovem vácuo, o que também ajuda a mantê-lo no lugar.
O coletor menstrual pode ser usado por até 12 horas seguidas. O intervalo para esvaziá-lo pode depender do fluxo menstrual de cada pessoa, sendo recomendado verificar o coletor no mesmo intervalo que trocaria um absorvente interno nos dias de maior fluxo.
Muitas vezes, as pessoas têm a impressão de que seu fluxo menstrual é maior do que realmente é. Usuárias de coletores menstruais relatam que, ao coletar o sangue em um único local, percebem que a quantidade não é tão grande quanto imaginavam. Vale lembrar que o coletor comporta cerca de 30 ml, enquanto o fluxo menstrual médio varia entre 30 e 80 ml durante todo o ciclo.
Para retirar o coletor, é preciso apertar a base com cuidado e puxá-lo. Contrair o assoalho pélvico, como ao fazer cocô, pode ajudar na tarefa. Caso o coletor esteja muito cheio, pode haver um pequeno vazamento, mas isso não é um problema, basta limpar e recolocar.
Higienização
O sangue pode ser descartado no vaso sanitário ou na pia, e o coletor deve ser enxaguado antes de ser recolocado. O uso de sabonete neutro é recomendado para higienizar o coletor, evitando alergias e irritações.
Ao final de cada ciclo menstrual, é importante ferver o coletor por cinco a dez minutos para uma limpeza mais completa. No entanto, é essencial estar perto para evitar que o coletor queime. Caso isso ocorra, será necessário comprar outro.
Principais Cuidados
Mulheres que utilizam DIU ou anel vaginal anticoncepcional podem usar o coletor menstrual sem problemas. O DIU pode exigir um pouco mais de esforço para ser retirado, mas o coletor não será o responsável por expulsá-lo. Quanto ao anel, ele geralmente é usado fora do período de fluxo menstrual, mas pode ser utilizado junto com o coletor, se necessário.
O coletor menstrual não se move durante a realização das necessidades fisiológicas, seja ao fazer cocô ou urinar. Caso haja desconforto, basta retirá-lo, fazer a higiene e recolocá-lo corretamente. Vale ressaltar que a uretra e o canal vaginal são orifícios distintos.
Você não precisa usar absorventes junto com o coletor menstrual, mas, nos primeiros ciclos, se sentir insegurança, pode utilizá-los em conjunto até se adaptar ao uso exclusivo do coletor. Usar o coletor é uma oportunidade de autoconhecimento e pode levar um tempo para se acostumar e encontrar a melhor forma de usá-lo. Caso não se adapte, tudo bem, cada pessoa é diferente e pode ter preferências diversas.
Por fim, é importante ressaltar que o coletor menstrual não deve ser utilizado durante o período pós-parto, pois o sangramento nessa fase não é menstruação, mas sim o chamado fluxo loquial, que precisa ser eliminado naturalmente.
Se o coletor cair no vaso sanitário ou apresentar alguma alteração de textura, ranhura ou queimadura durante a fervura, é necessário comprar outro, pois esses problemas podem comprometer a segurança e a eficácia do produto.
O coletor menstrual é de uso pessoal e intransferível, sendo importante não compartilhá-lo com outras pessoas. O uso do coletor menstrual é uma excelente opção para mulheres que praticam esportes, incluindo natação, bicicleta, pilates, entre outros. No entanto, é importante não utilizar o coletor em casos de infecção urinária ou DST, pois ele pode causar desconforto e, caso esteja contaminado, agravar a infecção ou a doença.
O coletor menstrual é uma alternativa prática, sustentável e segura para o período menstrual, proporcionando maior liberdade e conforto para as mulheres. Cada pessoa pode se adaptar ao uso do coletor de forma única, e é importante respeitar as preferências e necessidades individuais.
Em conclusão, o uso de coletores menstruais é uma escolha que vai muito além do simples conforto e praticidade. Ao optarmos por essa alternativa sustentável, estamos contribuindo ativamente para a preservação do meio ambiente. A quantidade alarmante de resíduos gerados pelos absorventes descartáveis é um problema ambiental que não podemos mais ignorar.
Ao adotar os coletores menstruais, estamos reduzindo significativamente nossa pegada ecológica, uma vez que eles podem ser reutilizados por anos a fio. Além disso, eles são uma opção segura e saudável, não apresentando riscos de síndrome do choque tóxico como os absorventes descartáveis.
Portanto, cada vez que escolhemos o coletor menstrual, estamos tomando uma atitude consciente em prol do nosso planeta e das gerações futuras. Junte-se ao movimento pela sustentabilidade menstrual e faça a diferença em sua vida e no mundo ao seu redor!
Texto: Bruno Cirillo e Larissa Schäfer